190 191 alicerça na primeira visão de Proença Filho rável de Egoísmos e Preconceitos! Se (aquela em que o negro é visto como objeto) caminhares para a esquerda, outra , com um trecho de um texto em prosa de parede, de Ciências e Críticas, mais Cruz e Sousa, um dos poetas que mais so- alta do que a primeira. Se caminhares freram o preconceito racial no Brasil, mesmo para a frente, ainda nova parede, feita tendo excelente escolaridade. Porém, ao per- de Despeito e Impotências, tremenda, der a proteção do padrinho adotivo, um ho- de granito, broncamente se elevará mem branco e rico, o poeta advogado viu-se do alto! Se caminhares, enfim, para vítima de um preconceito racial tão intenso trás, há ainda uma derradeira parede, que culminou, praticamente, em sua expul- fechando tudo, fechando tudo - horrí- são do estado natal, Santa Catarina, pois não vel! - parede de Imbecilidade e Igno- conseguia trabalho condizente com sua es- rância, te deixará n'um frio espasmo colaridade e, quando conseguia, era tão per- de terror absoluto. (...) E as estranhas seguido que não aguentava conviver com o paredes hão de subir – longas, terrífi- assédio moral a que era submetido por ser cas! Hão de subir, subir, subir mudas, negro, desiludindo-se em cada vínculo em- silenciosas, até as Estrelas, deixando- DISCRIMINAÇÃO RACIAL E pregatício. Tamanho sofrimento o obrigou a te para sempre perdidamente alucina- buscar um reinício de vida no Rio de Janeiro, do e emparedado dentro do teu So- ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO onde, também, não conseguiu um trabalho nho [...]2 que fizesse jus à sua formação. 1 Passados mais de cem anos do ocorrido a Rúbia Zanotelli de Alvarenga Em decorrência dessa convivência com o Advogada Cruz e Sousa, a metáfora do emparedamento preconceito, Cruz e Souza deu à luz um texto continua, infelizmente, subesistindo, não na em prosa intitulado “Emparedado”, do qual forma do racismo explícito – visto que, hoje, se cita, a seguir, um trecho, que reflete magni- existem leis punitivas à pratica dele, mas em Sumário: 1. Discriminação e direito do tra- O estudo não se atém a fatos específicos ficamente como se devem sentir os trabalha- sua maneira mais subreptícia, o assédio mo- balho; 2. Discriminação racial e assédio mo- da História como é usual, e, sim, basicamen- dores negros impedidos de desempenhar em ral, ocorrente principalmente em ambientes ral no trabalho. te, a situações ocorridas a um grande poe- paz suas atividades de trabalho em função de trabalho, onde pode acontecer de modo ta simbolista da Literatura brasileira, Cruz e do preconceito étnico e do assédio moral a vertical descendente, ascendente ou hori- INTRODUÇÃO Sousa (1861- 1898). Em um artigo intitulado que são submetidos por essa herança históri- zontal. “A trajetória do negro na Literatura Brasilei- co-cultural perversa que aflige milhares de Este artigo inicia-se de forma diferente da ra“, Domício Proença Filho - um dos gran- afrodescendentes no dia a dia, veja-se: É dessa prática nociva ao trabalhador de que, comumente, iniciam-se os artigos per- des estudiosos brasileiros -, situa o negro em etnia negra que trata este artigo, pelo qual se tinentes à área do Direito Trabalhista. Meio duas posições: a primeira, como ser-objeto Se caminhares para a direita, bate- busca visualizar aquilo em que a justiça do anacrônica, mas que intenta constatar a no- e, numa segunda visão, distanciada, como rás e esbarrarás ansioso, aflito, numa trabalho avançou no combate ao ato e aqui- ção de preconceito de raça (étnico), e uma sujeito, numa atitude compromissada na luta parede horrendamente incomensu- lo em que se precisa avançar. de suas grandes consequências, o assédio por um melhor lugar social. Tal estudo gerou moral, vigente neste País há séculos. a motivação de iniciar este artigo, que se 2. Cruz e Sousa, o notável poeta do simbolismo brasileiro, é um caso singular. Negro, filho de escravos alforriados, com nome, sobrenome e educação esmerada ganhos dos senhores de seus pais, tendo sofrido amargamente a violência do preconceito que o impediu, entre outras discri- minações, de assumir o cargo de promotor público em Laguna, deixa entrever na sua obra as marcas do conflito em que se dilacerava. No plano da ação, assume a luta contra a opressão racial e, entre outras atividades, dirige o jornalzinho O Moleque, significativo desde o título, e deixa nove 1. Doutora e Mestre em Direito do Trabalho pela Puc Minas. Professora de Direito da Faculdade Casa do Estudante e advogada. poemas e dois textos em prosa comprometidos com a causa abolicionista. Sua obra literária é um testemunho de sua luta contra o preconceito PROENÇA, Domicio Filho. A trajetória do negro na literatura brasileira. Estud. av. v.18 n.50 São Paulo jan./abr. 2004. Disponível em: http:// e o assédio moral. Seu texto em prosa “O Emparedado" não dá margem a dúvidas sobre isso. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0103- dx.doi.org/10.1590/S0103-40142004000100017. Acesso em: 23/11/2014. 40142004000100017. Acesso em: 23/11/2014.
