32 33 4 HERMENÊUTICA E MÉTODO SISTEMÁTICO não está sujeito a concurso de credores e A interpretação postulada por Ricardo porta a coerência interna do ordenamento DE INTERPRETAÇÃO: DO POSTULADO DA UNI- não se submete à habilitação em falência, Mariz de Oliveira somente pode ser compre- jurídico, conforme revela a didática lição de 21 DADE DO SISTEMA JURÍDICO À COMPATIBI- concordata, liquidação, inventário ou arro- endida como fruto de uma concepção não Luís Roberto Barroso sobre a interpretação 19 LIZAÇÃO DOS ARTS. 29 DA LEI Nº 6.830/80 lamento acabou dando ensejo a interpre- sistemática do ordenamento jurídico, inter- da Constituição: “Mesmo as regras que re- E 186 DO CTN tações no sentido de que, nada obstante o pretação que incorre no equívoco de tomar gem situações específicas, particulares, de- privilégio assegurado ao crédito trabalhista isoladamente o preceito do art. 29 da LEF vem ser interpretadas de forma que não se A hermenêutica jurídica é a ciência da inter- sobre o crédito fiscal no art. 186 do CTN, o quando deveria considerá-lo – o método sis- choquem com o plano geral da Carta” (BAR- pretação das leis. Para cumprir o objetivo de crédito tributário poderia ser satisfeito no ju- temático de interpretação visa a preservar ROSO, 2010, p. 141-142). definir o alcance dos preceitos legais, estuda os ízo fiscal de forma definitiva, inclusive sem a unidade do ordenamento normativo – no diversos métodos de interpretação da lei e as observância ao pagamento prioritário devi- contexto dos demais di- A precisão da inter- respectivas interações. O método sistemático do ao crédito trabalhista em decorrência do plomas legais correlatos, “A interpretação de pretação sistemática disputa – a observação é de Luís Roberto Bar- privilégio legal previsto na precitada regra do especialmente o Código uma norma isolada sustentada por Hum- roso - com o teleológico a primazia no proces- Código Tributário Nacional. Tributário Nacional, sob do contexto no qual berto Theodoro Júnior so interpretativo (BARROSO, 2010, p. 140). Se o pena de perder de vista acerca do art. 29 da Lei método teleológico de interpretação orienta-se Humberto Theodoro Júnior relata, no par- o fato de que esse “[...] está compreendida pode de Executivos Fiscais à finalidade da norma jurídica interpretada, o ticular, que, diante dos termos exagerada- diploma legal predica a conduzir o intérprete a pode ser aferida tanto método sistemático de interpretação funda-se mente amplos do art. 29 da Lei nº 6.830/80, prevalência dos créditos equívoco, como na doutrina quanto na 20 na ideia de que o ordenamento jurídico cons- entendeu Ricardo Mariz de Oliveira que até trabalhistas sobre os cré- geralmente acontece jurisprudência. Na dou- titui um “sistema de preceitos coordenados ou as garantias legais de preferência dos crédi- ditos fiscais”, conforme quando se despreza o trina, essa aferição é subordinados, que convivem harmonicamen- tos trabalhistas teriam sido preteridas pelo preleciona João Damas- obtida nos comentários te” (BARROSO, loc. cit.). preceito da Lei de Executivos Fiscais, com o ceno Borges de Miranda elemento contextual na de Anderson Soares Ma- abandono da sistemática do próprio Código (2005, p. 1315) diante da interpretação da lei.” deira acerca da relação Conformando uma estrutura orgânica que Tributário Nacional (art. 186). Contudo, o pro- correlata antinomia tam- de coordenação com pressupõe ordem e unidade, esse organismo cessualista mineiro desnuda o equívoco da bém sugerida pela pri- que o art. 186 do CTN jurídico unitário relaciona suas partes ao todo, interpretação postulada por Ricardo Mariz de meira leitura do art. 187 do CTN. conforma a interpretação do art. 29 da Lei nº de tal modo que o dispositivo legal interpretado Oliveira, ao esclarecer que o art. 29 da Lei de 6.830/80. Ao comentar a interpretação dada o seja em harmonia com o contexto normativo Execução Fiscal quis apenas excluir a Fazen- A interpretação de uma norma isolada do ao art. 29 da Lei nº 6.830/80 pelos tribunais, no qual está compreendido. O postulado da da Pública da participação nos juízos univer- contexto no qual está compreendida pode o autor observa que a “jurisprudência se que- unidade do ordenamento normativo enquan- sais como o da falência e o do concurso civil conduzir o intérprete a equívoco, como ge- dou a entender que não poderia o fisco se so- to sistema é conformado pela lógica da não de credores. Entretanto, não entrou em linha ralmente acontece quando se despreza o brepor à preferência dos credores protegidos contradição: as partes são interpretadas em de cogitação alterar privilégios instituídos elemento contextual na interpretação da lei. pela legislação trabalhista”. harmonia com o seu conjunto, superando-se pelas leis de direito material em vigor. Isso Isso ocorre porque “[...] a interpretação de eventuais contradições por uma interpretação porque – pondera Humberto Theodoro Jú- uma norma – a observação é do tributarista A acertada observação de Anderson Soa- preordenada a reconduzir o dispositivo inter- nior – não seria razoável que, em questão de Hugo de Brito Machado (2009, p. 676) – não res Madeira decorre da supremacia da legisla- pretado à unidade do sistema e de sua auto- direito material como essa, pudesse ocorrer deve ser feita fora do contexto em que se en- ção complementar sobre a legislação ordiná- poiética coerência interna. revogação de uma lei complementar, como carta, mas tendo-se em consideração outras ria. O autor contextualiza o dispositivo do art. é o Código Tributário Nacional, por uma sim- normas com as quais se deve harmonizar”. 29 da LEF no âmbito do sistema dos execu- O fato de o art. 29 da Lei de Executi- ples lei ordinária (THEODORO JÚNIOR, 2009, Por vezes identificadas como a mais racional tivos fiscais, identificando na supremacia do vos Fiscais estabelecer que o crédito fiscal p. 179), como é a Lei nº 6.830/80. e científica, à interpretação sistemática im- Código Tributário Nacional o consagrado cri- 21. O autor informa que devemos a Pietro Merola Chiercia o mais amplo estudo sobre interpretação sistemática do direito constitucio- 19. A previsão do art. 187 do CTN é semelhante à previsão do art. 29 da Lei nº 6.830/80. nal, destacando que o jurista italiano atribui à interpretação sistemática uma posição de “prioridade lógica com respeito a outros critérios interpre- 20. “Dívida Ativa da Fazenda Pública”. RT Informa, 261:5. tativos” (1978, p. 243 et seq.).
