22 23 1.1 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO zação laboral, que também geram alienação O trabalho prescrito, por sua vez, é aque- Prazer é o princípio mobilizador que “co- e sofrimento. A consequência do aumento le em que a descrição das atribuições cor- loca o sujeito em ação para a busca da gra- O estudo das dinâmicas que levam ao da produtividade, do ritmo da execução das responde ao que antecede a execução da tificação, realização de si e reconhecimento prazer e ao sofrimento no trabalho e aos tarefas e do cumprimento de metas desenca- tarefa. São constituídos de normas, tempo e pelo outro da utilidade e beleza do trabalho” seus desdobramentos, inclusive psicossomá- dearam o aparecimento de patologias men- controle exigido para o desempenho da ta- (VIEIRA et al., 2013, p. 290). Já o sofrimento é ticos, também compreende as consequên- tais relacionadas ao trabalho, como suicídios refa. Servem de fonte de reconhecimento e uma vivência subjetiva intermediária entre a cias das organizações e modelos de gestão no trabalho e enfermidades oriundas do assé- de punição para quem não cumpre a tarefa doença mental e o bem-estar psíquico (VIEI- do trabalho sobre o aparelho psíquico do dio e da sobrecarga. estabelecida. RA et al., 2013, p. 421), é um espaço clíni- trabalhador. co intermediário, que marca a evolução de O modo como o trabalho é organizado in- Trabalho, nessa perspectiva, é tudo aquilo uma luta entre, de um lado, funcionamento Com base na Ergonomia, Molinier (2013, fluencia a vida do trabalhador, apropria-se não que não está prescrito, porque não é o pres- psíquico e mecanismo de defesa e, de outro, p. 85) afirma que a organização do trabalho apenas do tempo e dos seus movimentos, mas crito que realiza o trabalho, mas a ação real pressões organizacionais desestabilizadoras. compreende a divisão técnica, social e hierár- de sua subjetividade (VIEIRA et al., 2013, p. do trabalhador. A prescrição não prevê inú- Tanto o prazer como o sofrimento são resul- quica do trabalho. A primeira é como as tare- 270). O trabalho não se resume apenas numa meras dificuldades que podem aparecer no tados da combinação entre história do sujeito fas são realizadas, a produtividade esperada, relação salarial ou empregatícia, mas consiste cotidiano de trabalho e a realidade é muito com a organização do trabalho, de como ele ou seja, as regras formais. no trabalhar, ou seja, um mais complexa do que qualquer regra ou reage às condições sociais, políticas e éticas A divisão social e hierár- modo específico de en- manual possam prever (VIEIRA et al., 2013, p da organização e dos processos de trabalho. quica do trabalho constitui O modo como o volver a subjetividade, o 271). as formas de comando e trabalho é organizado próprio corpo, e o modo Para Dejuors, o sofrimento é inerente ao de coordenação, os níveis influencia a vida de exercer o trabalho real Na lacuna existente entre o trabalho pres- trabalho porque há um conflito central entre de responsabilidade e de do trabalhador, em face do prescrito. crito e o real, encontram-se as contradições, a organização do trabalho, detentora de nor- autonomia e tudo o que os conflitos, as incoerências e as inconsistên- mas e prescrições, e o funcionamento psíqui- envolve a avaliação do tra- apropria-se não 1.2 TRABALHO PRES- cias do trabalho, que impõem dificuldades co, pautado pelo desejo. Das pesquisas reali- balho. apenas do tempo CRITO aos trabalhadores (VIEIRA et al., 2013b, p. zadas no Brasil de 1998 a 2007, percebeu-se e dos seus E TRABALHO REAL 468). Tais fatores são funcionais, caso man- A organização do tra- tenham a saúde mental do trabalhador, ou balho ganhou impulso no movimentos, mas Para Christophe De- podem ser patogênicos, quando não conse- modelo taylorista, fundado de sua subjetividade. jours (2012, pp. 127-128), guem sustentar a higidez psíquica dele. em princípios da “adminis- cada trabalhador, ao rea- tração científica do traba- lizar uma tarefa, procura 1.3 VIVÊNCIAS DE PRAZER lho”, posteriormente adaptados para outros adaptá-la “numa ordem, numa sequência de E SOFRIMENTO NO TRABALHO modelos. Henry Ford aplicou-os na indústria gestos, escolhendo os instrumentos adequa- automobilística com a esteira de produção dos” até encontrar um modo de trabalhar Para Dejours (2011b), o trabalho pode tra- em massa. No Japão, a Toyota desenvolveu próprio e pessoal, organizando o tempo em zer prazer ou sofrimento, mas um não exclui um modelo de produção flexível bastante di- fases de trabalho e de descanso e protegen- o outro, necessariamente. A noção de prazer fundido em outros países em detrimento da do o corpo contra sobrecarga em prol do seu e de sofrimento no trabalho tem sua origem rigidez e da padronização na execução das equilíbrio psicossomático. O trabalho real é na Psicanálise. Segundo Freud (1974), a bus- tarefas. essa maneira desenvolvida pelo trabalhador ca do prazer e a fuga do sofrimento fazem para lidar com as situações reais de suas ativi- parte da constituição subjetiva, da formação Novos modelos de gestão do trabalho, dades, composta por suas interações com os do ego e de todos os mecanismos de defesas dentro de um contexto neoliberal e de glo- recursos disponibilizados pela organização e individuais e coletivos, objetos da psicodinâ- balização, trouxeram novas formas de organi- com outros sujeitos. mica do trabalho.
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