82 No que tange ao trabalho sexual, o ele- Já no âmbito da legalidade para o exer- mento de celeuma em relação à validade de cício da profissão, no que se refere ao setor seu trabalho consiste na licitude ou não do privado, este se traduz no art. 5º, II da Consti- objeto contratual – a atividade sexual. tuição Federal, compreendendo a liberdade de agir em não contradição à lei. A inclusão dos requisitos de não contrarie- dade à moral e bons costumes na definição Consequentemente, a ausência do reco- de licitude cível não acompanha o estágio nhecimento desta atividade como profissão em que se encontra a compreensão das li- trará incongruentes consequências jurídicas berdades individuais e da legalidade no âm- à esta classe de trabalhadores. Consoante à bito privado, demonstrando o inconveniente doutrina de Alice Monteiro de Barros (2009, paternalismo jurídico na tentativa de prote- p. 247-248 e p. 524), o contrato de trabalho ger a sociedade de atividade lícita e legítima desenvolvido em atividade ilícita é inválido e por apego e preservação de valores morais nulo, e não repercute quaisquer efeitos traba- tradicionais de determinada classe. lhistas, nem mesmo a retribuição pelos ser- viços prestados. Isto se dá em razão de uma Nota-se que no plano da legalidade penal, das características do contrato de trabalho o exercício da prostituição é legal, tendo, no ser a sua onerosidade, repercussão esta que entanto, sido criminalizados diversos exercí- inexiste quando o objeto é considerado ilícito cios relacionados à livre e consciente venda e o contrato consequentemente nulo. do sexo sob o Título VI do Código Penal Brasi- A nulidade do contrato invalida os efeitos leiro como ofensivos à dignidade sexual, espe- que do ato decorreriam (DELGADO, 2015, cificamente em seu Capítulo V, como formas p. 560), tornando impossível a retomada ao de exploração sexual. A própria prostituição, status quo ante em razão de a teoria das apesar de não criminalizada, ainda é vista por nulidades se aplicar de maneira idêntica ao doutrinadores como uma das formas de ex- processo civil no que se refere à ilicitude do ploração sexual (CUNHA; GOMES; MAZZUOLI, objeto (DELGADO, 2015, p. 565), tornando o 2009, p. 58-59 apud CAPEZ, 2012, p. 212). contrato sem qualquer repercussão trabalhis- ta, gerando enriquecimento sem causa do Nesse sentido, quanto à ofensa à dignida- tomador do serviço. Contudo, é exatamen- de sexual dos exercícios vinculados à prosti- te este o entendimento dos tribunais pátrios, tuição, Mouçoçah afirma: consoante ao julgamento do Tribunal de Jus- tiça de Minas Gerais: (...) o ato de prostituir-se não afeta a dig- nidade sexual em seu sentido político, pois EMENTA: INDENIZAÇÃO - DANOS MATE- o objeto de proteção dos crimes sexuais RIAIS - LUCROS CESSANTES - PROSTITUI- não é a moral sexual, e sim a agressão à ÇÃO - ATIVIDADE NÃO REGULAMENTADA melhor expressividade do conceito de dig- - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. nidade sexual, que é o direito à autodeter- O comércio do corpo, ainda hoje, é repu- minação sexual. Portanto, exploração exis- diado socialmente por afrontar a moral e te apenas nos casos em que este livre agir os bons costumes, sendo juridicamente é lesionado (…) (MOUÇOÇAH, 2014, p. 13). impossível o pleito fundado no exercício Rev. do Trib. Reg. Trab. 10ª Região, Brasília, v. 20, n. 2, 2016
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